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 Alvan, o Mestre da TV          memória de Isabel Fomm de Vasconcellos

 

RONALDO ALVAN DE VASCONCELLOS

nasceu em São Paulo, SP, a 22 de maio de 1936 e

morreu no dia 7 de junho de 2004.

Foi um mestre da TV para muita gente que está no meio até hoje e ainda se lembra dele.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Alvan, aos 20 anos de idade, 1956

 

 

Alvan, de camisa azul, e Volpi, no lançamento do meu segundo livro

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Links que contam nossa história na TV:

programa médico (Junta Médica)

programa feminista (Condição de Mulher)

A série que se chamou “Rádio Patrulha”.

Rede Mulher de TV

Nosso amigo Marcos Volpi, a propósito do aniversário da morte de meu irmão, Ronaldo Alvan, escreve no Facebook que Alvan, além de seu amigo, foi um grande mestre, que ensinou muito de rádio e TV a ele. Volpi teve um quadro no meu programa da Rede Mulher de TV, começou ainda garoto na na velha TV Tupi,  e hoje comanda o seu "Madrugadão" na All TV. Mas passou muitas madrugadas papeando com o Alvan, num apartamento que ele teve aqui no mesmo prédio onde moramos e acho que também na casa da Deputado Martinho Rodrigues.

 

Porque Volpi chamou meu irmão de Mestre , começamos a nos lembrar de vários dos "discípulos" dele. Técnicos que trabalharam sob o seu comando na extinta TV Excelsior, na Globo, na Vila Rica de Belo Horizonte, na Aratu da Bahia... Gente que Caetano e eu encontramos depois nas emissoras de TV onde trabalhei, gente que se lembrava do Alvan como seu mestre na profissão.

 

Mas a história mais incrível, sobre isso, que eu tenho para contar, aconteceu em 1991, quando a Avenida Paulista fez 100 anos. Naquela época eu tinha uma assistente querida, a Denise Serrão, tinha acabado de criar um personagem chamado "O Fantasma da Paulista" e estava envolvida até os gorgomilos com o aniversário da Avenida, criada em 1891 por Joaquim Eugênio de Lima. Estava surpresa também por ter descoberto que esse edifício onde moramos tinha sido erguido no terreno onde estava a primeira casa construída na Avenida. Então Denise e eu recortamos enormes letras de cartolina e escrevemos na janela do apartamento: "Aqui, a primeira casa da Paulista!" Não deu outra: a imprensa, que estava pela Avenida fazendo matérias sobre o centenário, ficou interessada.

 

Entre as entrevistas que dei naquele dia, uma foi para a TV Manchete (hoje Rede TV). A equipe de reportagem veio me entrevistar aqui no apartamento. De repente o câmera quase grita:

-- "Meu Deus, esse aqui é o Alvan!!" -- vendo a foto num porta retrato -- A senhora conhece ele?" E eu: -- "Ele é meu irmão".

 

Bastou isso para o rapaz se ajoelhar e pegar nas minhas mãos:

-- É uma honra conhecer a senhora! A senhora nem imagina o que o seu irmão fez por mim. Eu era um garoto simples, lá na Bahia. Fui trabalhar na TV Aratu e o seu irmão me ensinou a minha profissão, me ensinou tudo sobre cinema, fotografia e, se hoje estou aqui, como câmera, em São Paulo, ganhando bem, podendo sustentar a minha família, eu devo tudo a ele!"

E eu disse: "Eu também".

 

Alvan, quinze anos mais velho que eu, foi meu ídolo e meu exemplo na vida. Meu pai me ensinou o cinema e a fotografia. Mas foi o Alvan que me fez tomar gosto pela leitura, que me apresentou aos clássicos da Literatura, educou meu ouvido para a música erudita e me ensinou tudo o que eu sei sobre televisão. Sempre me lembro da Sula Miranda, na maquiagem da Rede Mulher, depois de ouvir uma crítica minha a alguma coisa que estava rolando na TV naquele momento:

-- Nossa, Isabel, assistir TV com você é fogo! Você vê tudo, tudo o que está na tela. -- e riu: -- Espero que não fique assistindo o meu programa!

 

Pois é; era o Alvan falando pela minha boca. Foi ele que me fez ver os deslizes da operação, da produção, dos apresentadores e os meus próprios, porque eu, é claro, também errava na TV, como todo mundo. Ele era exigente. Por isso o Boni gostava dele profissionalmente. Porque ele tinha o mesmo nível de exigência com a qualidade técnica e de conteúdo que fez da Rede Globo a maior emissora do país (e quem fez isso foi o Boni, sem dúvida, com sua proverbial exigência). Hoje em dia, quando vejo alguma besteira na Globo News (a emissora que mais assisto) penso que o Boni faz falta. Assim como o Alvan.

 

Alvan morreu de câncer do pulmão. Era famoso também por fumar um cigarro atrás do outro. Um dia me disse que já tinha fumado, durante toda a vida, uns dois apartamentos (era a conta de quanto ele gastava com cigarros).  Ele passou seus dois últimos meses de vida no hospital do câncer de Barretos, onde nosso primo Zé Reynaldo Walther de Almeida era diretor e onde assistia, todos os dias, o meu programa de TV da Rede Mulher. Ele tinha orgulho da sua aluna.

Assim como tenho orgulho do meu irmão e mestre.

 

 

 

Carta antiga a Alvan

 

São Paulo, Brasil, América do Sul, Terra, Universo Conhecido
11 de agosto de 2010 18h02’
 

 

Meu querido irmão Alvan

Coloquei pra rodar um dos primeiros discos MP3 que era seu e, quando a Gal começou a cantar, me bateu aquela vontade de escrever para você.

O disco já está na faixa 21 porque fui terminar umas coisas antes pra, depois, poder me dedicar inteiramente a esta carta.

Carta é uma coisa antiga e esta aqui pretende ser como aquelas antigas cartas dos anos 1970, que os nossos pais levavam de carro até a Praça Marechal Deodoro, onde então ficava a TV Globo,  junto com outras coisinhas que podiam estar fazendo falta lá, em Salvador, Bahia, onde você tinha ido morar com a Alice e o Paulo.

Eram cartas enormes que viajavam no malote da Rede Globo, num tempo em que o nosso correio ainda não era maravilhoso como se tornou depois, num tempo em que fazer um interurbano era uma aventura sujeita a espera de 3, 4 ou mais horas, num tempo em que ninguém – nem mesmo o visionário do nosso pai, que via à frente do tempo dele – podia sonhar com qualquer coisa parecida com a Internet...

Naquela época, você, dirigindo a programação da TV Aratu (então afiliada da Rede Globo), toureava os milicos da censura e eu vivia a angústia de ser contra a Ditadura, mas também contra os meus coleguinhas de esquerda que falavam em luta armada e assaltavam bancos.

Você me respondia datilografando em papel jornal, ora imensas, ora lacônicas cartas. Você ganhava alguma coisa como 30 mil dólares por mês, mas também carregava suas angústias e a depressão galopante, que veio com os genes dos Fomm, e que acabou com a sua vida e a sua glória.

Desde que você se foi tenho me perguntado por que alguém tão estupidamente inteligente, dono de um coração generoso e emotivo, porque alguém assim como você nasceu sob o triste signo da doença depressão. Por que, alguém como você veio a este planeta para vivenciar amores e oportunidades perdidos apenas pela ausência dos tais comprimidos que hoje o Tom Cruise classificaria como receitas da subciência, os antidepressivos.

Tenho que abrir um parênteses para te confessar que este teu disco mp3 esteve guardado por todos esses anos junto às montanhas de discos que temos e que o estou ouvindo pela primeira vez. São gravações da Gal que eu – embora conheça muito a MPB – desconhecia. E o teu bom gosto, mais uma vez, me proporciona momentos de beleza e satisfação.

Foi também o teu bom gosto que me ensinou a apreciar a boa literatura, a boa música e até o estranho fascínio da indecifrável matemática.

Te amei sempre, mesmo quando brigávamos.

Te amei quando você era o máximo, tinha todo aquele poder global, dinheiro e posição.

Mas te amei também quando toda a sua fortuna escorreu por entre teus dedos e você se tornou um sujeito amargurado, aquele sujeito que um dia me disse que não podia tomar antidepressivos porque eles faziam você sentir-se bem e você não podia sentir-se bem porque, afinal, não tinha mulher, nem trabalho e nem dinheiro.

Te amei sempre, por aquilo que você era e não por aquilo que você tinha.

Somos pessoas assim, aprendemos com nossos pais (e eles devem ter aprendido com os nossos avós que aprenderam com seus pais e, assim sucessivamente até os primeiros seres humanos desse planeta), aprendemos que ser é melhor e mais gratificante que ter e, por isso mesmo, temos sempre o que nos é necessário para ser plenamente, mas não mais que isso.

Talvez tua sabedoria não precisasse de mais do que você teve até que aquele câncer, o cigarro e a depressão te matassem.

Talvez, para teus últimos dias, fosse suficiente o computador, a praia, a caipirinha, o teu inseparável cigarrinho e aquelas moças, belas, por perto.

Embora inacessível nesse momento, você está sempre comigo.

No jardim do Paulicéia, caminhando pela Paulista, no prédio da TV Gazeta, nas páginas dos livros que leio, na música e nos meus microfones.

Acho que você estaria orgulhoso do meu programa de rádio, do meu primeiro lugar de audiência na popular rádio AM. Assim como me lembro dos seus olhos brilhando ao falar das centenas de entrevistas que dei quando do lançamento do meu terceiro livro (que, risos, não vendeu nada!) e me lembro de ter sabido que lá, no hospital do câncer, sob os cuidados do nosso primo e médico-anjo Zé Reynaldo, você ligava a TV ao meio dia e espalhava pro hospital inteiro que estava assistindo o programa da sua irmã. Você, o irmão que foi tão mais importante que eu na história da TV do Brasil. Você, morrendo suavemente no hospital público, encantando as enfermeiras com as suas gracinhas e atendido com o privilégio que mais importava naquele momento: o da melhor Medicina.

Nesse momento Gal canta: “Será que você ainda pensa em mim? Será que você ainda pensa?”

Esqueci todos os nossos momentos difíceis.

E me lembro de quando eu tinha 6 anos e você me ensinava álgebra,

me lembro da gente esquiando juntos na represa do Guarapiranga,

me lembro de você me dizendo – eu com crise de adolescência – que os nossos pais eram pessoas maravilhosas,

me lembro de você chegando do Rio, onde trabalhava na TV Excelsior, com o porta malas do seu fusca cheio de presentes de natal para os primos que, como eu, ainda eram crianças,

me lembro dos natais na sua casa da Bahia e de você, sossegadamente, negociando com um coronel da ditadura, para me arrancar das masmorras do regime onde eu teria certamente ido parar se não fosse, naquele momento, a “irmã da TV Globo”,

me lembro de você chegando de volta à São Paulo nos anos 1980 e da gente saindo na noite, pra todos os botecos em que a minha fase boêmia frequentava e, no Riveira,  do Henrique Meirelles pensando que você era meu namorado, com um certo ciúme...

me lembro de estar triste porque o Beto Tatsch não me ligara e de você me dizendo: “Bel, homem quando tá a fim vai atrás. Pula fora, esse cara não quer nada com você...”

me lembro de você me chamando para produzir um programa médico na TV Gazeta, o primeiro programa médico da TV comercial brasileira, já que afinal eu sempre quisera ir pra TV e você nunca permitira (não era ambiente pra mim, você dizia...risos...) mas agora eu tinha um marido que seguraria a barra, o Caetano... muito engraçado...

me lembro da gente inaugurando a Rede Mulher de TV, eu cheia de esperanças e você me dizendo “vamos ver como esse cara (o diretor) vai tentar nos passar pra trás”...

me lembro de quando você veio morar aqui no prédio e, todos os domingos, antes de ir almoçar com a mamãe no apartamento dela, a gente tinha aquele ritual de se reunir aqui em casa – você, o Caetano, eu e às vezes alguma visita como a Vera, a Beth ou o Volpi -- para tomar um campari e jogar conversa fora,

me lembro de tudo o que você me ensinou e me lembro de como me ensinou a fazer TV e a ver TV.

Agora, que como diz o meu diretor Luiz Augusto Biasi, sou uma aprendiz (dele) de rádio, às vezes vejo você na imagem dele e, como sempre, como agora ouvindo teu disco (pra mim, disco novo), você me faz feliz.

Até breve, meu irmão. Um grande beijo da tua
Bel.

 

 

 

Adeus, Alvan memória de Isabel Fomm de Vasconcellos

 

 
 

 

Na Rede Mulher de TV, dirigindo o meu programa, anos 1990

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Wanda, nossa mãe, a irmã dela Jeannette e Alfredinho e

Alvan, meus irmãos no "triângulo" do centro de São Paulo,

Anos 1940.

No laboratório de cinema de nosso pai, revelando filmes.

Na praia, 1955, comigo (e com a Borg Wager do nosso pai) e na piscina da Jeannette, 1998, com Caetano, meu marido

Muito exigente com a qualidade do que vai ao ar, assim era o Alvan.

Com ele, ao longo de uma vida, eu aprendi tudo, tudo mesmo, sobre fazer TV. Até as complicações técnicas.

 

Alvan era meu irmão. Mas, muito além disso, ele foi um dos pioneiros da TV brasileira. Um  homem que dedicou toda a sua vida à televisão e que, nos últimos anos, andava realmente inconformado com o baixo nível que tomou conta da nossa telinha.

 

Jamais, porém, deixou de assistir a todos os canais, com aquele olho crítico que esquadrinhava cada canto da tela e que sacava toda e qualquer bobagem que escapasse da boca dos apresentadores, inclusive da minha.

Muito exigente com a qualidade do que vai ao ar, assim era o Alvan.

Com ele, ao longo de uma vida, eu aprendi tudo, tudo mesmo, sobre fazer TV. Até as complicações técnicas.

 

Alvan começou (como eu também) a lidar com as imagens no laboratório de cinema do nosso pai.

 

Quando a TV chegou ao Brasil, em 1950, ele fez estágio na Tupi. De lá saiu para trabalhar na TV Paulista, canal 5 (a Globo nem existia...), depois TV Excelsior de São Paulo e do Rio. Nessa época, a Excelsior era a líder de audiência.

Já no meio dos anos 1960 começou a organizar emissoras por esse Brasil afora, como a TV Vila Rica, de Belo Horizonte e outras, para a Globo, que iniciava seu império. Passou 10 anos na TV Aratu, então afiliada à Rede Globo, nos anos 1970, onde era responsável pela programação (naquele tempo não havia a facilidade do satélite, só havia um canal da embratel e as afiliadas tinham uma grande programação local).

Da Aratu foi para a Bandeirantes Bahia e, depois, no começo dos anos 1980, veio dirigir a programação da TV Gazeta de S.Paulo.

 

Foi só em 1984, quando eu comecei na TV com meus programas médicos, que tive a oportunidade de trabalhar com ele.

Dez anos depois fomos, os dois, para a Rede Mulher, que estava inaugurando sua emissora em São Paulo.

Alvan ficou lá conosco até 1998. Eu continuei até 2007, quando a emissora se tornou Record News.

 

Alvan conviveu e trabalhou com os grandes homens da TV brasileira. Boni, Lafon, Alberto Maluf, Mauro Salles, Waldemar de Moraes, Milton Zanella, Marco Aurélio, Johnny Saad e muitos outros. Além disso, porque reestruturou muitas emissoras, acabou ensinando muita gente, muita gente mesmo.

 

Eu espero que, no céu, haja uma ótima TV onde ele esteja agora dirigindo a programação... Alvan morreu no dia 7 de junho. Tinha completado 68 anos em 22 de maio.

 

Os frutos do seu trabalho, no entanto, estão espalhados pelas TVs do nosso Brasil, pelas mãos de tantos profissionais que aprenderam com ele muito do seu ofício.

 

Isabel, 9 de Junho de 2004

 

 

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Volpi Programa Madrugadão adorei isabel o alvan realmente foi um mestre para varias pessoas principalmente para mim, alem de ser um grande amigo que saudades....

Alexis Ponce Berço é tudo !!!

Manfred Fischer Grande Alvan....saudades

Luiz Fernando Walther de Almeida Natal de 1965....eu e Ze ganhamos uma mesa de totoh ou .pebolim, presente do Alvan que trabalhava na TV Excelsior
Isabel Fomm de Vasconcellos Ainda bem que vc se lembra... eu tb me lembro. Mas algumas de nossas primas esqueceram. Quando ele trabalhava no Rio, às vezes chegava em cima da hora pra véspera de Natal, então uma grande festa na casa dos nossos pais, com tios e primos vindo de outras cidades, mesas colossais, árvores enfeitadas, muito lindo. Ele sempre vinha com o
fuska cheio de presentes pros primos, muitos livros e, um dia, no banco de trás, banco abaixado, do fusca coral a mesa de pebolim. Eu me lembro. E fiquei meio triste quando uma de nossas primas, quando eu relembrava os presentes de natal que ele trazia, me disse: "presentes do Alvan? Que presentes?"... Que coisa. Como é possível esquecer um carinho tão grande?
Cesar Rosangela Marques Lembrancas do primo Alvan, sempre. Dos seus presentes, nao posso me esquecer, inclusive os livros. Junto com meus pais foi um grande incentivador da leitura. Saudades sempre. Hoje, no dia do abraco, sinta-se abracado fortemente e carinhosamente onde quer que voce esteja, grande primo.
Vera Krausz Boas recordações... e que receba as melhores vibrações este foi quem me batizou... prima Vera !!!
Elizabeth Krausz Primo presente, em momentos alegres e tristes. Sempre presente Alvan. Saudade de você.