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(Elise Genest, Cavalo Triste)

 

 

Alazão, Cor de Cobre

(Quando Fala o Coração dos Animais)

Por José Eduardo Pereira Lima, ZEDU.

 

 

Meu pai vendia frutas e verduras numa carroça puxada pelo seu fiel amigo Alazão, um dócil cavalo cor de cobre. O animal sabia, exatamente, em frente de que casa parar para atender aos fregueses fiéis, sem que meu pai tivesse que puxar as rédeas, tal era a cumplicidade entre eles.

 

Quando ambos chegavam do trabalho, no começo da tarde, tinha ficado implícito, embora sem muitas palavras (meu pai não sabia lidar direito com o afeto), que eu deveria completar o triângulo daquela equação. Era minha obrigação descarregar as caixas, tirar o arreio do Alazão, que o livrava do varal da carroça – aliviado, dava um pequeno relincho de agradecimento, como tivesse se despido de desconfortáveis paletó, suspensório e gravata. O mais chato era “desfalfar” a alfafa, que vinha prensada e eu ficava torcendo e forçando que ele a comesse depressa, ansioso por levá-lo a pastar. Era quando subia no seu lombo em pelo. Submisso, me deixava cavalgar por um tempo antes de gozar o merecido pasto, até eu voltar no final da tarde para recolhê-lo para a cocheira improvisada nos fundos da casa.
 

Um dia Alazão foi atropelado e quebrou uma pata. Era preciso sacrificá-lo. Deitado no chão enquanto a injeção fazia efeito, levantou a cabeça num esforço supremo e percorreu com os olhos todos os curiosos que o rodeavam. Ao encontrar o olhar de seu dono, deu um último e fraco relinchar antes de pousar lentamente a cabeça no chão de terra. Olhei para meu pai e foi a única vez que o vi chorar.

 

Trecho da crônica “Quando fala o coração dos animais”, publicada no livro “40 Viagens e Um Roteiro”, à venda em e-book através dos links abaixo.

 

https://www.book7.com.br/…/lit…/40-viagens-e-um-roteiro.html