Triste espécie |
(Debret, 1830 década, Aldeia de caboclos em Cantagalo) |
Talvez uns quinze dias
antes, um jovem agente de saúde indígena, Cloudione Rodrigues Souza,
também forte, também saudável, também bonito e queimado de sol, morreu
ferido à bala por fazendeiros e seus capangas que chegaram em camionetes
e abriram fogo contra grupos de índios guarani kaiowá, no Mato Grosso do
Sul. Outras tantas pessoas foram feridas, entre elas uma criança de 12
anos. O grupo indígena estava próximo à sua aldeia, em uma terra
indígena já reconhecida pela Funai, e ainda não demarcada. Como disse a
ativista Ysani Kalapalo, em vídeo de protesto contra o ataque,
referindo-se à indiferença da elite que, na defesa do desenvolvimento a
qualquer preço, parecem afirmar com seus canos fumegantes: “Em nome do
progresso vamos ter que matar alguns índios, e pronto.” Por essas e muitas outras, o ano de 2016 está indo pelo mesmo caminho do ano de 2015 quando, por esse tipo de pensamento, ambição e assassinatos bárbaros, a organização não governamental Global Witness concedeu ao Brasil um título trágico e vergonhoso: somos o país mais perigoso para ativistas ambientais. |
No ano passado, matamos
cinquenta defensores do meio ambiente e da terra indígena. Cinquenta
brasileiros que foram mortos principalmente em comunidades rurais da
Amazônia, por resistirem aos desmatamentos, e ao agronegócio.
Diante disso, pode parecer
estranho recordar o que disse o físico italiano, Carlo Rovelli, em seu
pequeno (e excelente) livro, “Sete breves lições de física”. Nada mais
longe da concretude da luta pela defesa do meio-ambiente na Amazônia do
que um físico teórico, alguém poderia pensar. Mas pensaria errado. No
final do livro onde discorre sobre gravidade, física quântica e outras
questões assim fáceis, ele nos lembra que, pelo andar da carruagem, além
de lidar com nossa morte individual, teremos que lidar também com a
morte coletiva de nossa civilização. Diz ele: “Eu acredito que a nossa espécie não vai durar muito tempo. Ela não parece ter sido feita com o material que permitiu à tartaruga, por exemplo, continuar existindo mais ou menos imutável por centenas de milhões de anos, ou seja, por centenas de anos antes de sequer começarmos a existir. Nós pertencemos a um gênero de espécie de vida curta. Todos os nossos primos já estão extintos. Mais ainda: nós causamos danos. As mudanças brutais do clima e do meio ambiente que provocamos dificilmente nos pouparão.” |