Revista UpPharma 2021 01

 

No Brasil, não há estudos ou pesquisas que comprovem elevação da taxa de suicídios durante a pandemia. Mas sabe-se que houve aumento de transtornos mentais com o distanciamento social, o que pode ser um fator de risco para esse tipo de comportamento. Quanto mais afetada a saúde mental, maiores as chances de suicídio. Ou seja, sempre existe uma doença mental relacionada em um suicídio. Existem dados de um estudo de Michigan, nos EUA, que indicam um aumento de 32% no número de suicídios nesse período de pandemia. No Brasil, o site CQM – Comunica que Muda -  também revelou que as notícias de suicídio passaram de 7,5% em 2017 para 42% em 2020.

 

veja a revista na íntegra

 

Idosos e Jovens, Grandes Vítimas da Depressão

Entrevista Dra. June M Megre à Revista UpPharma

 

 

Da mesma forma que fazem parte do grupo de risco para o contágio da Covid-19, os idosos estão entre as pessoas que mais têm sofrido com depressão e transtornos mentais nessa pandemia. O distanciamento da família, o sedentarismo, a impossibilidade de se dedicar a atividades corriqueiras e prazerosas, como fazer caminhadas, visitar amigos e ir ao mercado, a restrição à circulação etc., são apenas alguns gatilhos que contribuem para que as pessoas nesta faixa etária desenvolvam quadros depressivos.

 

O fato é que a depressão é uma das doenças mentais que mais atinge os idosos. De acordo com números do IBGE do ano passado, indivíduos com idades entre 60 e 64 anos representam a faixa etária com maior proporção (11,1%), entre os 11,2 milhões de brasileiros diagnosticados com a doença, índice que vem aumentando com o passar dos anos. A presença e apoio da família são fundamentais nesse momento. Mesmo em tempos de pandemia, é preciso cuidar desses indivíduos, criando rotinas saudáveis, ficando atento aos sintomas e buscando ajuda especializada, cujo tratamento pode envolver interação medicamentosa e psicoterapia.

 

Para dar mais detalhes sobre esse assunto, a UPpharma ouviu a Dra. June Melles Megre, Médica especialista em Psiquiatria e Psicoterapia, Chefe da Equipe Psiquiátrica de Interconsultas no Hospital Samaritano, Membro da Diretoria do Comitê de Psiquiatria Forense da Associação Paulista de Medicina e Membro da Diretoria da Associação de Psiquiatria Biológica do Brasil, que abordou também a vulnerabilidade dos jovens, um grupo que tem desenvolvido igualmente diversos transtornos mentais durante a pandemia.

 

UPpharma Fala-se sobre um aumento da depressão, principalmente, em idosos, em decorrência da pandemia e do isolamento social. Como a senhora vê essa questão e de que forma os psiquiatras podem ajudar para prevenção da depressão junto à população?

 

Dra. June – O número de quadros depressivos ou ansiosos realmente aumentou muito na pandemia. Um trabalho realizado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro mostrou que esses episódios praticamente dobraram entre março e abril deste ano. Os idosos, que já formam uma população mais vulnerável, foram bastante impactados com o isolamento social. Vários fatores contribuíram para isso. A própria falta de preparo da sociedade de não valorizar os cuidados com os idosos e a falta de preparo dos serviços de saúde para atendimento da terceira idade, sem dúvida, colaboraram para esse número maior de eventos psíquicos nesta faixa etária.

 

- Como é possível reconhecer a depressão nos idosos?

 

- É essencial ficar atento a esse tipo de problema. Não só a família, mas também os médicos que atendem a essa população. Por incrível que pareça, ainda hoje existem colegas de trabalho que negligenciam queixas de idosos, acreditando que quadros depressivos são comuns e inerentes à terceira idade.

 

Em geral, esses transtornos nessa faixa etária se apresentam com alterações de sono, perda de prazer em atividades diárias, ausência de ressonância afetiva, ruminações sobre o passado, tendência a isolamento e diversas outras reações que podem ser confundidas com comportamentos do envelhecimento, mas que os familiares devem manter atenção. Assim que perceber algum desses sintomas, a família deve procurar um atendimento especializado. Para prevenção desses eventos, é fundamental que o idoso tenha uma rotina diária supervisionada e regrada, estabelecendo-se horários para acordar e dormir, se alimentar e se exercitar – que é muito importante para o bem-estar desse indivíduo. Além disso, visando garantir uma boa saúde dos idosos, é também aconselhável reservar horários para a realização de atividades cognitivas que estimulem a mente e o raciocínio, deixando menos tempo para a utilização de dispositivos, como celular e computador. Apesar do isolamento social, é imprescindível criar uma rede de apoio afetivo-social para não deixar esse idoso totalmente isolado. No caso de pessoas com a saúde mais fragilizada, uma alternativa é organizar encontros virtuais com a família, filhos e netos, para que o idoso não se sinta marginalizado e não sofra de solidão.

 

- O suicídio é um problema preocupante em todo o mundo. A pandemia pode ter alguma relação com um possível aumento do número de suicídios?

 

- No Brasil, não há estudos ou pesquisas que comprovem elevação da taxa de suicídios durante a pandemia. Mas sabe-se que houve aumento de transtornos mentais com o distanciamento social, o que pode ser um fator de risco para esse tipo de comportamento. Quanto mais afetada a saúde mental, maiores as chances de suicídio. Ou seja, sempre existe uma doença mental relacionada em um suicídio. Existem dados de um estudo de Michigan, nos EUA, que indicam um aumento de 32% no número de suicídios nesse período de pandemia. No Brasil, o site CQM – Comunica que Muda -  também revelou que as notícias de suicídio passaram de 7,5% em 2017 para 42% em 2020. E quando se fala em suicídio, precisamos ficar atentos aos jovens, que apresentam maior vulnerabilidade para esse tipo de comportamento. São indivíduos que, pela própria juventude, ainda não desenvolveram a resiliência necessária para enfrentar esse momento, como as pessoas mais adultas. Muitos começam a ter comportamentos destrutivos, inclinação para o uso excessivo de álcool ou drogas de diversos tipos, o que acaba se intensificando com o tempo e impactando a saúde física e mental desse jovem.

 

- Como a família pode oferecer ajuda aos pacientes com tendência ao suicídio?

 

- Mais uma vez, não negligenciando os sintomas. A ajuda especializada é fundamental. Um idoso e jovem saudáveis não ficam falando o tempo inteiro sobre morte ou sobre tirar a própria vida. A família não pode perder esse “time”. Diante de qualquer declaração desse tipo ou sintomas associados, como isolamento, cansaço, desânimo etc., os parentes precisam acompanhar mais de perto. Mesmo que muitos serviços presenciais estejam temporariamente suspensos, há opções de consultas on-line que podem ajudar a família e o paciente. Assim que notar pensamentos negativos ou relacionados à morte, evite deixar essa pessoa sozinha e retire de seu alcance objetos que possam machucá-los, como armas de fogo, facas, medicamentos e outros.